sábado, 4 de dezembro de 2010

Estado Unidos – Uma Banana Republic Emergente

Por Marco Aurélio
 
A vasta maioria dos brasileiros educados subestima a medida em que os Estados Unidos viraram uma república das bananas. Nas últimas décadas, a “terra do livre capitalismo” virou um lugar onde:

O banco central impede qualquer institutição financeira de quebrar, seja emprestando dinheiro para os grandes bancos a taxas zero (ou negativas, quando ajustadas para a inflação), seja trocando por papel bom o lixo de instituições que jogaram com o dinheiro dos depositantes, erraram, se deram mal, mas agora não estão muito a fim de arcar com as consequências. Esse dinheiro, fornecido involuntariamente pelo contribuinte americano, é imediatamente emprestado de volta pelos bancos ao governo via a compra de títulos. Uma arbitragem fantástica, mas disponível apenas para um seleto clube em Manhattan – do qual você, infelizmente, não faz parte.

Igualmente, o arrojo empreendedor de empresas como Apple, Microsoft e Google depende da disposição secular do contribuinte americano em continuar a financiar o desenvolvimento de badulaques de alta tecnologia, usando o pretexto e o rótulo eufemístico de “Defesa”. Agências militares como o DARPA (Defense Advanced Research Projects Agency) e seus antecessores desenvolveram a locomotiva, o rádio, toda a base tecnológica da indústria automobilística (para ser usada em tanques e afins) e naval (para ser usada em navios e semelhantes), o sonar, o radar, o avião a jato, quase toda a tecnologia espacial (que permite ao Google oferecer coisas como o Google Maps, Google Street View e Google Earth), a fibra óptica e o chip de computador, para mencionar apenas alguns. Agora estão ativamente desenvolvendo projetos em biotecnologia, nanotecnologia e robótica – para fins de “defesa”, claro. Mas, no momento em que já não há mais risco envolvido no P&D, as associações de ex-alunos do MIT, University of California e outras institutições semelhantes (que fazem o trabalho pesado e arriscado por trás do grosso dessas tecnologias, usando dinheiro do governo americano) aproximam-se a fazem a transferência da tecnologia para o setor privado. Que, depois, é livre para competir com seus pares pelo mundo, tendo recebido essa mãozinha do governo americano.

É fácil continuar (e pretendo fazê-lo em outros posts), mas acho que os parágrafos acima dão uma boa idéia do que vem acontecendo. Os Estados Unidos “bom” (aquele que pelo menos buscava manter uma aparência de justiça, de recompensar cada um pelos seus méritos, de ser um bastião da liberdade de expressão, de ser a terra para onde o povo oprimido da Europa pôde fugir no século XIX) – esse país, do hamburger com milk shake, do jeans, camiseta e tênis, do Elvis, dos Beach Boys, de Janis Joplin e Woodstock, da Hollywood de Doris Day, Cary Grant, Jimmy Stewart, Grace Kelley, Fred Astaire, Frank Sinatra e Cole Porter – esse lugar morreu já há algumas décadas.

Pode bem ser que o fechamento da janela do ouro pelo Nixon em 1971 – que permitiu que os EUA disparassem a imprimir dinheiro, distorcendo mercados e favorecendo sua manipulação; que acelerou a transferência de dinheiro da classe média para amigos dos políticos em Wall Street – que, em troca, bancam suas campanhas; que fez desaparecer o nexo essencial entre a ídéia de ganhar dinheiro e a necessidade de trabalhar, e não especular em Wall Street ou jogar em cassinos em Las Vegas (há diferença?); pode ter sido esse fatídico dia em 1971, há quase 40 anos, que marcou o início do fim.

Claro que a queda da máscara só pode ser uma coisa positiva, já que nos permite ver a verdadeira dimensão do problema e tomar as medidas necessárias para enfrentá-lo. Mas é bom que se saiba que estamos lidando com um país completamente diferente daquele que a maior parte da mídia de massa pelo mundo ainda acredita existir.

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